Capítulo VII

As doenças de maior ocorrência no Brasil na cavidade bucal e, portanto, de maior interesse do ponto de vista da saúde coletiva são:

 

1.      Cárie dentária

2.      Doença Periodontal

3.      Má colusão

4.      Câncer bucal

5.      Fluorose

6.      Lábio leporino

7.      Fendas palatinas

 

Para cada uma delas é preciso que o profissional saiba diagnosticar e tratar ou encaminhar tratamento. Mas não apenas o profissional. O acadêmico deve ser orientado na clínica quanto a esta realidade e saber diagnosticar as doenças.

 

A Cárie dental:

 

Doença infecto-contagiosa e multifatorial que atinge a população em qualquer faixa etária e que pode causar danos severos ao dente, incluindo sua decomposição e perda.

Alguns fatores são estimulantes, como a dieta rica em açúcares (dieta-dependente), microorganismos, má higiene oral e tempo.

 

Esses açúcares acumulados serão metabolizados pelas bactérias acidogênicas da placa dental. Isto resultará na queda do PH e causará a desmineralização do esmalte e aumento da porosidade. Com a inativação da placa ou pela higienização oral, consegue-se reverter o quadro, ou seja, os ácidos produzidos se difundem, ocorre estimulação das glândulas salivares e conseqüentemente uma maior produção de saliva, permitindo a remineralização do dente (funciona como um sistema de defesa do organismo, que reverte o processo desmineralizante, voltando às condições iniciais). O desequilíbrio da des-re produzido por uma ingestão freqüente de dieta cariogênica, durante um “controle periódico”, pode produzir desmineralizações mais severas, porém, ainda reversíveis, sem prejuízo ao esmalte.

O controle mecânico de placa, entendido como a sua total remoção, potencializa a função

remineralizadora da saliva, mantendo a lesão do esmalte no estágio reversível por um período indeterminado. Se o intervalo de tempo de “controle periódico” de placa for  insuficiente ou a ingestão de dieta cariogênica for mais freqüente, podem surgir desmineralizações irreversíveis, porém em nível subclínico, não sendo consideradas  lesões de cárie, já que se dão com ausência de sinais. Se nessas condições de lesão subclínica houver o reequilíbrio da des-re, por meio de um “controle periódico” suficiente ou de uma dieta cariogênica menos freqüente, esta lesão poderá paralisar por um tempo indeterminado, sem chegar a ser diagnosticada como lesão de cárie.

Assim, se o desequilíbrio da des-re continuar por mais tempo, devido a um “controle periódico” com um intervalo de tempo maior ou por ausência de controle e dieta  cariogênica freqüente, essa lesão irreversível poderá progredir chegando a nível clínico, com lesões de esmalte, apresentando sinais, determinando uma lesão de cárie.

Quanto maior o desequilíbrio, isto é, quanto maior a freqüência de dieta cariogênica e maior o intervalo de tempo sem controle de placa, mais intensa será a lesão de mancha branca, chegando à cavitação do esmalte, determinando assim, uma lesão de cárie avançada.

 

Sabe-se que o principal agente causador da cárie é o Streptococcus mutans. Mas deve-se salientar que, além dos atores biológicos citados acima, há também os fatores sociais que interferem na doença. Por exemplo, a cultura daquele indivíduo, a escolaridade, informação, renda, moradia, acesso a serviços de saúde, entre outros.

Para a doença cárie é preciso promover, prevenir e tratar. Promover saúde através de atividades de educação para aquela população; prevenir através de fluoretação das águas e dos dentifrícios, campanhas de escovação dental, controle de placa; e tratar da doença estimulando a ida ao serviço público para tratamento da cárie, estabelecer um plano preventivo terapêutico, orientações de higiene oral e/ou para apenas manutenção da boa saúde oral.

 

As periodontopatias: 

 

 

São doenças que afetam o periodonto (gengiva, inserção gengival, ligamento periodontal, cemento radicular e osso alveolar). As formas mais comuns são a gengivite e a periodontite.  Ambas causadas por microorganismos; a etiologia é a placa dental.

A gengivite é caracterizada por sangramento gengival, vermelhidão e geralmente, cálculo subgengival. O seu tratamento é por remoção do cálculo e instruções de higiene oral. Deve-se ter muito cuidado quanto ao tratamento, pois a gengivite se não tratada corretamente pode evoluir para a perda do osso de suporte, caracterizando a periodontite. Que além deste apresenta outros sintomas, como a presença de placa supragengival e subgengival, bolsa periodontal, sangramento espontâneo, mobilidade dental, entre outros.

O tratamento pode variar devido algumas diversidades da doença, mas a terapia básica é a remoção da placa sub e supragengival, além de instruções de higiene oral.

 

 

Má-oclusão:

 

A epidemiologia das oclusopatias envolve muitas questões acerca dessa alteração, incluindo o próprio conceito de má-oclusão. Consideramos aqui a má oclusão como um distúrbio na erupção dentária e no adequado alinhamento dos dentes nas maxilas, associado ou não à disfunção da articulação têmporo-mandibular, e atingem cerca de 45% dos indivíduos aos 12 anos. Pelo último levantamento epidemiológico nacional, em 2003, a prevalência de problemas oclusais moderados ou severos foi de 14,5% no Brasil, aos 5 anos de idade, sendo que, nesta idade, 61,5% das crianças apresentaram oclusão normal.

Embora todos os tipos de alterações da oclusão dentária sejam de interesse epidemiológico, à saúde pública interessa, principalmente, as alterações que interferem nas funções mastigatória e de fonação. Tais casos incluem um componente estético que também é considerado no conjunto. Costuma-se falar em má-oclusão incapacitante. Segundo o índice de estética dentária (DAI), na faixa etária dos 15 aos 19 anos de idade, 18,7% dos brasileiros apresentaram má-oclusão muito severa ou incapacitante em 2003.

O percentual aceito universalmente é de que cerca de 1% das pessoas apresentam má-oclusão incapacitante. Nesses casos, mantida a dentição permanente, o tratamento ortodôntico seria indispensável.

 

 

Câncer bucal

 

É um tipo de câncer que geralmente ocorre nos lábios (mais freqüentemente no lábio inferior), dentro da boca, na parte posterior da garganta, nas amígdalas ou nas glândulas salivares. É mais freqüente em homens do que em mulheres e atinge principalmente pessoas com mais de 40 anos de idade. O fumo, combinado com o excesso de bebida alcóolica, é um dos principais fatores de risco, segundo o Instituto Nacional do Câncer, que aponta o uso do tabaco como responsável por cerca de 80 a 90% das causas de câncer bucal.

Segundo o INCA, em 2010, serão 14.120 novos casos de câncer bucal, sendo 10.330 homens e 3.790 mulheres.
Se não for detectado de maneira precoce, o câncer bucal pode exigir tratamentos que vão da cirurgia (para a sua remoção) à radioterapia ou quimioterapia. Este câncer pode ser fatal. Uma das razões pelas quais este prognóstico é tão negativo é o fato de que os primeiros sintomas não serem reconhecidos logo. O diagnóstico precoce é fundamental para o sucesso do tratamento.

Nem sempre é possível visualizar os primeiros sinais que indicam a existência do câncer bucal, o que aumenta a importância das consultas regulares com o dentista ou o médico.


O principal sintoma deste tipo de câncer é o aparecimento de feridas na boca que não cicatrizam em uma semana. Outros sintomas são ulcerações superficiais, com menos de 2 cm de diâmetro, indolores (podendo sangrar ou não) e manchas esbranquiçadas ou avermelhadas nos lábios ou na mucosa bucal. Dificuldade para falar, mastigar e engolir, além de emagrecimento acentuado, dor e presença de linfadenomegalia cervical (caroço no pescoço) são sinais de câncer de boca em estágio avançado.

Para o tratamento, a cirurgia e/ou a radioterapia são, isolada ou associadamente, os métodos terapêuticos aplicáveis ao câncer de boca. Para lesões iniciais, tanto a cirurgia quanto a radioterapia tem bons resultados e sua indicação vai depender da localização do tumor e das alterações funcionais provocadas pelo tratamento (cura em 80% dos casos). 

As lesões iniciais são aquelas restritas ao seu local de origem e que não apresentam disseminação para gânglios linfáticos do pescoço ou para órgãos à distância. Mesmo lesões iniciais da cavidade oral, principalmente aquelas localizadas na língua e/ou assoalho de boca, podem apresentar disseminação subclínica para os gânglios linfáticos cervicais em 10% a 20% dos casos. Portanto, nestes casos, pode ser indicado o tratamento cirúrgico ou radioterápico eletivo do pescoço.


Nas demais lesões, se operáveis, a cirurgia está indicada, independentemente da radioterapia. Quando existe linfonodomegalia metastática (aumento dos 'gânglios'), é indicado o esvaziamento cervical do lado comprometido.  Nestes casos, o prognóstico é afetado negativamente.

A cirurgia radical do câncer de boca evoluiu com a incorporação de técnicas de reconstrução imediata, que permitiu largas ressecções e uma melhor recuperação do paciente. As deformidades, porém, ainda são grandes e o prognóstico dos casos, intermediário. A quimioterapia associada à radioterapia é empregada nos casos mais avançados, quando a cirurgia não é possível. O prognóstico, nestes casos, é extremamente grave, tendo em vista a impossibilidade de se controlar totalmente as lesões extensas.

 

 

Fluorose:

 

 

A fluorose dentária é uma anomalia do desenvolvimento dos dentes associada a deformações do esmalte que provoca aumento de porosidade, opacidade, manchamento e erosão do esmalte. Além de causar mudanças estéticas nos dentes, com o aparecimento de manchas de cor branca, marrom e até preta em sua superfície. A perda da substância do esmalte pode gerar deformidades anatômicas nos dentes, levando, em alguns casos, à perda dos mesmos.

A doença ocorre em conseqüência da ingestão, por períodos prolongados, de flúor em quantidade acima do limite estabelecido para a região, durante a fase de vida em que o esmalte está em formação, ou seja, do nascimento da criança até a idade dos quatro a cinco anos. Essa ingestão de fluoretos em excesso pode causar uma lesão de hipomineralização, subsuperficial profunda até a superfície do esmalte externo, que, em casos mais severos, se rompe logo após a erupção.

A fluorose nas suas formas brandas é comumente observada onde há água de abastecimento público fluoretada, contribuindo para isso outras fontes de flúor. Já as formas moderada e severa da doença são pouco observadas, sendo geralmente encontrada em locais onde o flúor está presente em altas concentrações na água de consumo.  Sabe-se da grande quantidade de flúor ingerida diariamente, por crianças na idade crítica para formação do esmalte dentário, pelas várias fontes de flúor disponíveis em seu cotidiano. Como o acesso a pasta de dente fluoretada tornou-se mais comum, aumentou à ingestão do produto, pelas crianças, durante a escovação, sendo esta também uma forma de exposição sistêmica indireta. Juntos, a água e a pasta de dente fluoretadas, podem ser uma explicação para o aumento da fluorose.

 

Lábio leporino e Fenda palatina:

 

A fissura lábio-palatal pode ser considerada como um distúrbio do desenvolvimento oro-facial (uma malformação congênita), podendo produzir graves problemas anatomo-funcionais e, em alguns casos, risco para a sobrevivência do indivíduo. É uma abertura no lábio ou no palato, podendo ser completa, lábio e palato. Essas aberturas resultam do desenvolvimento incompleto do lábio e/ou do palato (céu da boca) durante o período embrionário.

O lábio e o céu da boca desenvolvem-se separadamente durante os três primeiros meses de gestação. O lábio leporino afeta o lábio superior, variando desde uma incisura até uma fissura completa que se estende até o nariz. A fenda palatina afeta o céu da boca, com um sulco que pode se estender até a arcada dentária (palato duro). Estas anomalias podem aparecer em conjunto ou separadas.

Nas fissuras mais comuns o lado esquerdo e o direito do lábio não se juntam, ficando uma linha vertical aberta. A mesma situação pode acontecer com o céu da boca ou palato. Em casos mais raros pode haver duas fissuras no palato, uma do lado direito e outra do lado esquerdo.

A proporção de fissurados lábio-palatais registrada para o Brasil como um todo é de 1 fissurado para cada 650 nascimentos, segundo o principal centro de pesquisa e tratamento de fissurados do país, o Hospital de Pesquisas e Reabilitação de Lesões Lábio-Palatais da USP/Bauru. Porém, a incidência do lábio leporino e fenda palatina varia nas diferentes etnias; aproximadamente 1 em cada 1.000 caucasianos é afetado. A incidência da fenda palatina sozinha é de 1 em cada 2.500 pessoas.

 

Porém, esta prioridade e realidade não são a mesma em outros países. Por exemplo,

 

Prioridade em países desenvolvidos:

1.      Doença periodontais

2.      Má-oclusão

3.      Câncer bucal

4.      Fenda palatina

 

Prioridade em países africanos:

1.      Doença periodontal

2.      Fluorose endêmica

3.      Cárie dental

 

É indispensável que o aluno de graduação em Odontologia saiba das principais doenças bucais, saiba inseri-las num contexto social e enxergar de forma mais ampla sua prevenção, promoção e tratamento.

Todas estas doenças podem ser diminuídas em severidade se houver uma atenta anamnese do profissional, eficaz exame clínico e instruções de higiene oral ao paciente sempre.

A rotina de atendimento na clínica da faculdade permitirá essa abordagem ao aluno desde cedo, promovendo um hábito saudável de familiaridade e cautela no diagnóstico e tratamento.

 

 

Bibliografia:

1.      Artigo sobre Saúde Bucal Coletiva - Narvai, P. C. Diagnóstico de saúde bucal. São Paulo: Secretaria de Saúde do Município de São Paulo, 1988. [material de apoio à formação e desenvolvimento de recursos humanos odontológicos; texto de apoio das disciplinas da área de Odontologia Preventiva e Saúde Pública da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo]. Araujo, M. E.Saúde bucal: entendendo de forma total. In: Feller, C.; Gorab, R. (Org.). Atualização na clínica odontológica: módulos de atualização. v.1, 2000. p. 489- 508. Disponível em:https://www.fo.usp.br/departamentos/social/saude_coletiva/GTextoSBC.pdf

 

2.      Cárie dentária: um novo conceito José Eduardo de Oliveira Lima R Dental Press Ortodon Ortop Facial Maringá, v. 12, n. 6, p. 119-130, nov./dez. 2007. Disponível em:https://www.scielo.br/pdf/dpress/v12n6/a12v12n6.pdf

 

3.      O  Processo Des-Re - EDUARDO R. C. DE BAR ROS RGO, 37 (3) : 181-184, mai/jun ., 1989. Disponível em: https://www.uel.br/pessoal/buzato/pages/arquivos/seminarios/B5.pdf.pdf

 

4.      Câncer de boca – Instituto Nacional de Câncer (INCA). Disponível em: https://www.inca.gov.br/conteudo_view.asp?id=324

 

5.      Câncer de Boca – o que é? – Colgate. Disponível em:

https://www.colgate.com.br/app/Colgate/BR/OC/Information/OralHealthBasics/MedCondOralHealth/CancerOralHealth/OralCancerSignsSymptoms.cvsp

6.      Artigo sobre Fluorose dentária- Conhecendo para prevenir – O.,Rita de Cássia ; A.G.T. Maria de Fátima ; S.C.M. Patrícia – Fundação comunitária de Ensino Superior de Itabira. Disponível em: https://www.funcesi.br/Portals/1/Artigo%20-%20Rita%20-%20Fluorose%20Dent%C3%A1ria-OK.doc